Adoro explorar caminhos pouco conhecidos. Contudo, pelo receio de me perder e de encontrar com algum animal, prefiro não ir sozinha. Por isso fiquei tão feliz quando Adriana, a dona do hostel em que eu voluntariava em Taganga, no norte da Colômbia, propôs a trilha a Bonito Gordo, praia cujo nome nunca havia escutado antes.
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Fomos eu, Guille, um querido amigo que conheci em um voluntariado em Mina Clavero, na Argentina, e um casal de hóspedes da França, Greg e Ana. Segundo Adriana, Bonito Gordo era uma praia quase virgem e paradisíaca. Ela conhecia o lugar e, segundo ela, seria nossa guia. Cruzaríamos o morro em, segundo ela, duas horas, aproveitaríamos a água e voltaríamos, segundo ela, pelo mesmo trajeto. Mas ela estava errada.
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Antes mesmo de alcançarmos o começo da trilha, às 8h, ela teve que pedir indicações. Deveríamos ter percebido que seu conhecimento não era tão vasto como o prometido, mas estávamos empolgados, havíamos acordado cedo, preparado os sanduíches para levar e colocado as águas nas mochilas.
PERDIDOS NO PÉ DO MORRO
Chegamos no pé do morro e após percorrermos poucos metros, não havia mais caminho. Eu já estava disposta a voltar, mas o grupo optou por seguir (especialmente Adriana, que não queria admitir que nos havia metido em uma furada). Todos os vestígios da trilha tinham sido apagados em função das chuvas dos últimos dias.
A cada passo que dávamos, mais a mata fechava. Guille tomou a frente e foi abrindo caminho, não se importando com arranhões nos braços e pernas. Meu ânimo não estava muito bom, mas não queria pedir para voltar, então apenas o seguia praguejando entre os dentes.
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Depois de já ter caminhado o que acredito ter sido uma meia hora, o grupo parou para decidir o que faria. Adriana se havia mostrado despreparada e não queria reconhecer o erro. Senti que ela esperava que um de nós sugerisse que voltássemos. E, apesar de minha vontade de regressar, não lhe daria essa satisfação. Descer também não era uma boa alternativa, pois o terreno estava cada vez mais complicado, com terra e pedras soltas.
Ninguém dizia nada e nos olhávamos inutilmente. Tive a impressão que Guille queria seguir. E não tinha ideia de qual era a preferência dos franceses. Emburrada, em uma atitude infantil – e também calculando o risco de de queda do caminho por onde havíamos subido -, decidi continuar para cima.
Neste momento, entrei no modo sobrevivência. Eu e Guille formamos uma boa dupla na dianteira. Resolutos, escalamos as pedras e superamos os obstáculos, e, de tempos em tempos, ouvíamos os gritos de Adriana que nos seguia mais abaixo “gente, como está o caminho aí?”. “Não pior do que antes” era nossa resposta padrão.
ALIVIADOS EM LA CIMA
Finalmente, depois e umas duas horas de ascensão, chegamos ao topo do morro, “la cima“, nosso objetivo parcial. Nossa alegria foi imensa. Não que tivéssemos dúvidas disso (obviamente uma hora chegaríamos). Mas chegamos bem física e moralmente. E encontramos um caminho no chão. Aguardamos o resto do pessoal e optamos por seguir a trilha pela direita, pois era o mais lógico para chegar a Bonito Gordo.
Apesar da euforia, ainda não estávamos 100% aliviados, pois sabíamos que essa praia não tem acesso por estrada e a única maneira de chegar lá é ou caminhando ou de barco. Mas lidaríamos com essa preocupação no momento adequado. Precisávamos nos concentrar em como chegar até lá.
Logo avistamos a praia lá embaixo, à nossa esquerda, a uma distância grandinha, mas nada assustadora. O caminho também desapareceu e tivemos que, novamente, entrar no mato enquanto descíamos em direção à praia. Foi o segundo momento de racha no grupo.
TENSOS NA DESCIDA
Ana, a francesa, não se sentia confiante. Ela achava que, ao perder a praia de vista na medida em que íamos para baixo, acabaríamos desorientados. Greg não queria deixar sua namorada e Adriana já estava completamente assustada. Eu e Guille estávamos seguros de que, eventualmente, alcançaríamos a beira do mar. Recém eram 10h e ainda tínhamos muita luz do sol pela frente.
A cada 10 minutos parávamos para discutir o que faríamos. Isso acabava baixando nossa moral e confiança. Afinal, tomamos o que considero a melhor decisão: Eu e Guille fizemos o que achamos melhor e Adriana, Ana e Greg fizeram o que eles achavam melhor. Nos despedimos e cada fração do grupo tomou o seu rumo.
FELIZES EM BONITO GORDO
Sem mais interrupções, apenas curtas pausas para tomar água ou observar a flora e fauna, seguimos tranquilos nossa caminhada morro abaixo. Voltamos a curtir o passeio. Menos de duas horas depois chegamos à praia deserta.
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As risadas não foram contidas, mesmo que a praia não tivesse chegado nem nos pés das nossas expectativas. Mesmo assim, nos banhamos felizes. O leve ardor do sal nos cortes por todo o corpo foi diminuído pela alegria de haver alcançado o destino.
Relaxamos na água e, ao sair, passamos a tentar solucionar nosso próximo problema: como sair de Bonito Gordo? Estávamos nos dirigindo para a sombra da árvore onde almoçaríamos (um corpo bem alimentado sempre pensa melhor) quando avistamos uma lancha vindo em nossa direção. Não podíamos acreditar na nossa sorte.
Depois que atracaram, fomos falar com eles. Eram trabalhadores que estavam levando palha para construir uma cabana por ali e zarpariam em uma hora e meia para Taganga. Degustamos com muito prazer nossos sanduíches e voltei ao mar enquanto esperávamos nossa carona.
RADIANTES EM TAGANGA
A navegação foi linda, com ondas altas e divertidas e uma paisagem de tirar o fôlego. Contudo, ao dar-nos conta da imensidão do morro, nos preocupamos por nossos amigos, mas tentamos ficar positivos, assim como havíamos feito ao longo de todo aquele dia. Ao desembarcar, deixamos algo do dinheiro que tínhamos como agradecimento ao capitão.
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A felicidade em estar de volta a Taganga foi tanta que compramos sorvete e cerveja para celebrar na piscina do hostel. Antes mesmo de entrar, soubemos que os outros três estavam perdidos. Eles tinham sinal de celular e puderam contactar-se com a polícia, que já estava fazendo buscas.
Mesmo com essa tensão, eu e Guille comemoramos nosso retorno e demos gracias a la vida na piscina. Estávamos radiantes. Bastava cruzar nossos olhares para cairmos na gargalhada. Contamos nossa aventura para um outro casal de hóspedes e ficamos na piscina até depois do anoitecer, quando, exaustos e assustados, chegaram os outros três. Eles subiram e desceram vários morros, sem nunca encontrar uma saída, resvalaram em pedras e até perderam sua lanterna. Mas estavam bem e era isso que importava.
O GUILLE TAMBÉM ESCREVEU, EM ESPANHOL, SOBRE ESTE EPISÓDIO. O TEXTO ESTÁ ÓTIMO E ESTÁ DISPONÍVEL NESTE LINK
Neste dia aprendi a importância de sempre manter o positivismo e o alto astral. Também a selecionar bem os parceiros de aventuras, cujo positivismo e alto astral também são fundamentais em situações como essa. Ainda hoje, dois meses e meio depois de um dos dias mais inesquecíveis da minha vida, tenho as marcas dos raspões na pele. E espero que fiquem assim para sempre, pois todas as vezes que os olho, lembro destas cenas, deste aprendizado e me dou conta que estar viva é bom demais.
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